Você clica no site de compras e espera alguns dias. Nesse intervalo, é provável que o produto encomendado vá passar por uma cidade específica da região metropolitana de São Paulo, em que boa parte da paisagem urbana é tomada pelo aço e concreto de enormes galpões.
Trata-se de Cajamar, a 29 km da capital paulista, que virou um grande centro logístico, onde estão instalados entrepostos de algumas das empresas mais ricas do Brasil e do mundo. Por isso, a cidade é chamada de “a Faria Lima dos galpões” ou “a Disney do ecommerce”.
Os galpões de onde entram e saem caminhões com livros, eletrônicos, móveis e outras dezenas de produtos transformaram a cidade. Mas quais são os impactos econômicos, sociais e urbanísticos dessa transformação? O Nexo mostra nesta reportagem.
A chegada dos grandes galpões
Cajamar fica a 29 km a noroeste da capital paulista, numa área cuja ocupação começou no início do século 20 em torno de uma fábrica de cimento. Assim como outros municípios da região metropolitana, traz entre duas características o fato de ser uma cidade-dormitório, onde vivem atualmente cerca de 78 mil habitantes.
Os grandes galpões chegaram no final dos anos 2000. Duas décadas depois, a cidade conta com quase 2 milhões de m² desses espaços de distribuição. Estão lá gigantes como Amazon, Magazine Luiza, Carrefour, Leroy Merlin e Mercado Livre.
1,8 milhão de m²
é a estimativa da metragem de galpões presentes em Cajamar no final de 2021, segundo a empresa de consultoria Siila. É a maior concentração do país
145
é o número de empresas com galpões funcionando na cidade, de acordo com dados da Associação Comercial de São Paulo levantados pelo Nexo
86%
dos novos galpões construídos no país em 2021 foram erguidos em Cajamar, segundo a Siila
40%
das encomendas do ecommerce do país são despachadas de Cajamar, segundo estimativa feita pela prefeitura em 2021
As construções de grandes espaços de entrepostos de distribuição que começaram tímidas em 2009 e se intensificaram nos anos seguintes, especialmente a partir de 2014.
Roberto Soares- Nexo
Foi naquele ano de 2014 que a Amazon, principal empresa de comércio eletrônico do mundo, estabeleceu seu primeiro galpão em Cajamar. Em junho de 2022, já são 11 galpões da empresa do bilionário Jeff Bezos, que tem no Brasil um dos seus principais mercados. O galpão mais recente foi inaugurado em maio de 2021, com uma área de 57 mil m², equivalente a cinco campos de futebol.
O Mercado Livre, maior player do ecommerce no país, estabeleceu suas atividades em Cajamar no ano de 2019, inaugurando 150 mil m² de galpões – algo próximo da área total do estádio do Maracanã, no Rio, que tem 186 mil m².
Por que Cajamar
Posição geográfica
Cajamar fica entre duas grandes cidades do estado: São Paulo e Campinas. Também é rodeada por duas das principais rodovias paulistas, a Anhanguera e a Bandeirantes. Além disso, está a 19 km do rodoanel Mário Covas, que interliga toda a malha rodoviária do estado mais populoso do Brasil.
Incentivos fiscais
A prefeitura dá de 50% a 100% de isenção do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) para os galpões desde 2016. Há contrapartidas: as empresas precisam ter no mínimo 50% de funcionários que residam em Cajamar e precisam investir de 2% a 5% dos custos totais da obra em infraestrutura local.
O crescimento do ecommerce no Brasil
O crescimento do número de galpões é explicado pelo boom do comércio eletrônico como um todo ao longo da década de 2010 e mais ainda a partir de 2020, quando estourou a pandemia da covid-19.
O BOOM DO ECOMMERCE
Com a tendência de alta para os próximos anos, a demanda por galpões logísticos deve aumentar. Projeção feita pelo portal E-Commerce Brasil em 2021 estimou que o segmento pode crescer 54% até o final de 2024.
Os impactos econômicos
A prefeitura cobra ISS (Imposto Sobre Serviços) das empresas que mantêm estoque comercial nos galpões da cidade. A legislação de 2020 fez a arrecadação anual de Cajamar dobrar.
A presença dos galpões aumentou o número de empregados formais da cidade, colocando Cajamar como o 5º município com mais formalidade no país.
O NÚMERO DE EMPREGOS FORMAIS
21,2%
foi a queda nos indicadores de desemprego de Cajamar entre 2012 e 2022, de acordo com dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) do Ministério da Economia
Ao todo, 21,9% dos empregos formais de Cajamar estão no setor de armazenamento e logística – de longe o segmento que mais emprega no município.
11,5 mil
é o número aproximado de pessoas que trabalham nos galpões de Cajamar
Se comparado com os outros 39 municípios da região geográfica imediata, Cajamar, apesar de ter o maior PIB per capita (R$ 252.959, em 2019), fica na 7ª posição no ranking do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) dessas cidades quando o assunto é a remuneração dos trabalhos.
Em 2020, o salário médio dos trabalhadores de galpões de Cajamar era de R$ 2.263, de acordo com dados do Sistema Estadual de Análise de Dados. O valor é menor que o salário médio geral da cidade, que era de R$ 3.329. O setor logístico não requer mão de obra especializada e há uma alta rotatividade no setor, o que explica os montantes pagos pela indústria.
“Eu tenho um sobrinho que foi contratado no fim do ano [2021] para um galpão, ficou lá dois meses e depois, quando acabou a temporada de festas, foi demitido, tá procurando alguma coisa até agora. E a gente sabe que logística não paga muito, né? Tem que lutar”, afirmou ao Nexo Marilza Ribeiro, de 59 anos. Ela mantém uma pequena loja de roupas no bairro de Vila União, zona leste da cidade.
Bairro de Vila União, em Cajamar. Ao fundo, um galpão
Foto: Rogério Lacanna/Nexo - 27.05.2022
Em 2018, o Índice de Gini de Cajamar foi de 0,49. O coeficiente, usado para aferir a desigualdade, vai de 0 a 1: quanto mais próximo de 1, mais desigual é a cidade. O índice foi maior do que a média das cidades vizinhas, que registraram pontuação de 0,41.
Também em 2018, o Índice Paulista de Responsabilidade Social, produzido por órgãos do governo do estado, colocou Cajamar como uma das cidades significativamente desiguais. “Qual a vantagem verdadeira que esses galpões estão trazendo ao município? Nenhuma”, disse ao Nexo a dona de casa Nerlândia Oliveira, de 48 anos.
A dona de casa Nerlândia Oliveira, moradora de Cajamar
Foto: Rogério Lacanna/Nexo - 27.05.2022
O fato de os empregos terem chegado, mesmo com os valores baixos, é comemorado por parte da população. “Tem mais trabalho agora, então eu acho bom que os galpões estejam aqui sim”, disse ao Nexo a dona de casa Maria Elza de Jesus, de 61 anos. Ela é vizinha de Nerlândia Oliveira. “Não tenho do que reclamar.”
“É bom a gente ter os galpões, aumentou o emprego, tá tudo melhor”, afirmou ao Nexo Vanderlei Souza, de 55 anos, dono de uma barraca de espetinhos ao lado de um dos sete galpões que cercam a entrada da cidade. “O meu movimento tá o mesmo, mas tem mais emprego para todo mundo.”
Vanderlei Souza, dono de uma barraca de espetinhos em Cajamar (SP)
Foto: Rogério Lacanna/Nexo - 27.05.2022
Os impactos urbanísticos
Desde 2016 empresas que instalam galpões em Cajamar precisam repassar de 2% a 5% dos custos totais da obra de construção dos galpões para que a prefeitura possa investir em infraestrutura local.
Em 2021, a prefeitura realizou 7% menos obras de infraestrutura do que o prometido para o ano, de acordo com relatório do Tribunal de Contas Estadual. Ao todo, foram aplicados R$ 1,07 milhão. As contas, porém, foram aprovadas pela corte. A prefeitura não quis falar com o Nexo, apesar de inúmeros pedidos.
Um trânsito cada vez mais parado
Marilza Ribeiro mora no bairro de Santa Terezinha, a 3 km de seu comércio na Vila União. “Já teve vezes que eu demorei duas horas para vir da minha casa até a loja”, disse ao Nexo.
As ladeiras, a qualidade do asfalto e a rotatividade dos ônibus locais fazem com que ela tenha que se deslocar de carro. No caminho, passa por filas intermináveis de dezenas de caminhões que se dirigem aos galpões que cercam os dois distritos.
O trânsito intenso é visto como um problema pelos dez moradores da cidade entrevistados pelo Nexo. “O trânsito é complicado, é muito caminhão junto”, disse Vanderlei Souza, dono da barraca de espetinhos ao lado de um galpão. “Minha esposa, Ana Lúcia, vai para São Paulo todo dia, ela leva uma hora e meia. Se não fosse tanto caminhão seriam só 45, 50 minutos. Precisamos de uma infraestrutura de trânsito melhor.”
Fila de caminhões na entrada de Cajamar (SP)
Foto: Rogério Lacanna/Nexo - 27.05.2022
No plano de metas da cidade para o período de 2021-2024, a administração cita iniciativas para melhorar o trânsito, como a duplicação de avenidas e a construção de vias de acesso.
Em maio de 2022, a prefeitura autorizou o início das obras de revitalização da rodovia Edgar Máximo Zambotto, na entrada da cidade, cercada por galpões. A iniciativa deve ampliar a sinalização e recapear 11,6 km de estrada.
A questão das áreas de risco
No bairro da Vila União, galpões da multinacional Prologis, que fica em um morro a menos de 50 metros da comunidade, causam preocupação entre os moradores.
Em 2021, a chuva intensa e a lama causaram uma enchente. “Muita gente perdeu tudo, a gente foi fazendo o que dava para fazer”, disse ao Nexo Rodrigo Oliveira, de 32 anos, genro de Marilza Ribeiro. Ele administra a loja de roupas ao lado da sogra.
“Já falaram que aí é área de risco. Nosso medo é que o reservatório que a Prologis tem lá em cima desabe e a água venha aqui pra cima da gente igual foi em Mariana [cidade mineira que passou por desastre ambiental em 2016]”, afirmou.
O reservatório em questão abastece as necessidades hídricas dos galpões (ar condicionado, banheiros, etc). O Nexo entrou em contato com a Prologis para saber o posicionamento da empresa acerca da questão, mas não obteve resposta.
Enchente no bairro de Vila União em Cajamar (SP)
Foto: Reprodução/André Barrado - YouTube
A prefeitura estabelece como parte de suas metas a construção de muros de contenção em áreas de risco. A administração considera a Vila União como local passível de alagamento, e parte do terreno onde está o galpão como uma área de risco médio.
A enchente foi causada pelo assoreamento dos rios e córregos que cortam a cidade, segundo uma nota oficial da prefeitura divulgada em fevereiro de 2022. “É resultado do acúmulo de lixo, entulho e até mesmo terra e areia no fundo dos rios, que passam a suportar cada vez menos água, provocando enchentes em época de grande quantidade de chuva”, dizia a nota.
“A prefeitura de Cajamar realiza todos os anos o trabalho de desassoreamento e dragagem dos rios e córregos que cortam a cidade. Com o uso de máquinas especiais, os trabalhadores retiram todo o tipo de lixo e detritos do fundo dos canais, aumentando a vazão dos rios”, concluía o texto oficial.
Os impactos ambientais
Os mananciais (nascentes de água doce) são parte da geografia municipal, integrando a Mata Atlântica local. A depender da localização, a construção dos galpões precisa rebaixar o lençol freático na qual será erguido o empreendimento. Isso significa aprofundar a água natural existente no solo ou retirá-la parcialmente.
Canteiro de obras da construção de um novo galpão em Cajamar
Foto: Rogério Lacanna/Nexo - 27.05.2022
O risco do rebaixamento é o de secar por completo o lençol freático. Em 1986, isso aconteceu no bairro Lavrinhas, em Cajamar. O solo ressecou, causando um buraco de 32 metros de diâmetro e 13 de profundidade que danificou 480 residências da região, deixando 2.400 pessoas desabrigadas.
Em 2014, o Ministério Público do Estado de São Paulo moveu uma ação civil pública contra a prefeitura de Cajamar e algumas das empresas que construíram galpões no município, sob denúncia de crime ambiental pela recanalização e alteração nos corpos d’água da cidade.
De acordo com o Ministério Público, o crescimento dos galpões “estaria colocando em risco os recursos hídricos e paisagísticos da região, além de uma das principais rodovias do Estado e parte da sociedade local.” O processo ainda está em andamento.
A qualidade do ar em Cajamar também piorou, segundo dados da Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo). Em relatório, a estação de monitoramento de Perus – que serve o município – mostrou que de 2014 a 2020 houve um aumento de cerca de 35% na presença de gases poluentes na cidade, fenômeno que se correlaciona com o aumento do tráfego de caminhões na região.
Ao mesmo tempo que sofrem os impactos da mudança do clima, as cidades estão entre os principais agentes do aquecimento global, pois emitem grande parte dos gases que causam o efeito estufa (por meio de setores como a indústria, a construção civil e os transportes).
“Todas as cidades que contam com maior presença de galpões logísticos fazem com que mais caminhões passem e necessitem de viagens mais longas, o que aumenta a emissão de gases do efeito estufa”, disse Leonardo Guerin, pesquisador de engenharia logística na Universidade de São Paulo, em sua dissertação de mestrado, de 2018.
“A poluição não está legal não”, disse ao Nexo Guilherme Araújo, de 20 anos, auxiliar logístico em um dos galpões da cidade. “Tenho rinite, o ar não está legal não.” Apesar disso, ele a presença dos galpões como positiva. “Melhorou a cidade, agora temos mais emprego por aqui.”
O auxiliar logístico Guilherme Araújo, 20
Foto: Rogério Lacanna/Nexo - 27.05.2022
Os impactos na segurança pública
Ao longo dos anos, o número de registros criminais na cidade cresceu. Em 2008, foram instaurados 315 inquéritos policiais no município, de acordo com a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo. Já em 2021, foram 1.042 investigações abertas. O aumento foi de 230%.
Cajamar teve o maior aumento no número de inquéritos instaurados de todas as cidades com quem faz fronteira no período, com exceção da capital paulista. Duas delas – Jundiaí e Pirapora do Bom Jesus – tiveram queda nos índices.
Um indicador que chama a atenção é o de roubo de cargas. Em 2008, foram nove incidentes. Em 2021, foram 20. Até maio de 2022, outros nove casos já haviam sido registrados.
“Em um levantamento preliminar referente aos inquéritos policiais, foi constatado que comparando o ano de 2011 e 2021, ocorreu um aumento substancial, passando de 567 inquéritos em 2011 para 1.042 em 2021. Nos quatro primeiros meses de 2022 foram 380 inquéritos instaurados, 186 prisões efetuadas e 64 veículos recuperados”, disse a Secretaria de Segurança Pública paulista em nota enviada ao Nexo.
A pasta sustentou, porém, que não é possível, com os dados atuais, estabelecer uma correlação causal entre o crescimento do número de galpões e o aumento nos índices de criminalidade. “Após levantamento de dados estatísticos e com base nos índices de dados públicos das delegacias do município de Cajamar, a Polícia Civil esclarece que não é possível efetuar uma relação direta entre o aumento da criminalidade e os galpões logísticos instalados no município na última década”, afirmou na nota.
Caminhões chegando em Cajamar (SP)
Foto: Rogério Lacanna/Nexo - 27.05.2022
Pesquisas internacionais dizem que o aumento do número de galpões pode ter relação com o crescimento de índices de criminalidade. Estudo de 2017 publicado na Revista de Economia Urbana dos EUA mostrou que cidades e bairros que contam com maior uso de terrenos para fins industriais (fábricas e galpões de grande porte, por exemplo) tendem a ter índices de criminalidade maiores. “A análise mostra que a finalidade do uso de terra é determinante para a incidência de crimes urbanos”, diz o artigo.
De acordo com a pesquisa, esse tipo de comunidade – com muitos galpões e fábricas, mas com espaços residenciais espalhados e poucas opções de convivência social e cultural – gera mais chances de haver os chamados “crimes de oportunidade”, aqueles que foram pouco premeditados e que dependem da ausência de muitas testemunhas ou policiamento, como o roubo de cargas, por exemplo.
A prefeitura tem como meta ampliar, até 2024, programas de policiamento e ações de segurança pública, como o monitoramento da cidade com câmeras de segurança. Há também apoio estadual.
Questões em aberto
Há duas grandes questões em aberto acerca do crescimento do número de galpões em Cajamar, comandada atualmente pelo prefeito Danilo Joan (PSD).
A primeira delas diz respeito à automação dos postos de trabalho. A estimativa é de que até 2030, robôs devem tomar cerca de 20 milhões de cargos do setor industrial ao redor do mundo.
A outra é o que pode acontecer com Cajamar se parte significativa das empresas decidir sair da cidade. Coffeyville, no estado americano do Kansas, tem menos de 10 mil habitantes segundo o último censo local de 2020. Em 1999, a Amazon construiu uma série de galpões no município, empregando uma porcentagem significativa da população. A construção se deu por políticas de incentivo fiscal atrativas para a empresa. Quinze anos depois, em 2014, a Amazon decidiu deixar a cidade, tendo encontrado municípios com políticas fiscais melhores.
A escolha da multinacional teve um grande impacto na economia de Coffeyville – os pouco mais de 1.000 funcionários se viram sem empregos. Logo, todo o setor de serviços e comércio da cidade sofreu uma queda brusca no movimento e no faturamento.
“Foi brutal. Nossos restaurantes, mercearias, eles levaram a porrada. Levou muito tempo para se recuperarem”, disse à rádio KWCH12 Trisha Purdon, diretora executiva de desenvolvimento do condado de Montgomery, que abriga Coffeyville, em 2020.
Não se sabe se a prefeitura de Cajamar tem algum tipo de plano para lidar com uma eventual saída dos galpões do município. O Nexo tentou entrar em contato com a administração, mas não obteve resposta.
A invasão de galpões sob análise
“Sinceramente, eu não consigo ver nenhum lado positivo nessa história toda não”, afirmou ao Nexo Alexandre Yassu, urbanista e mestre em planejamento urbano e regional pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e doutorando em gestão territorial pela Universidade Federal do ABC.
“Tudo bem, os galpões geram mais empregos, mas são postos de trabalho precarizados, que não dão muito dinheiro e que foram assegurados de um forma frágil, já que se essas empresas deixarem a cidade ou automatizarem os postos de trabalho, muita gente não vai ter mais o emprego”, disseYassu.
O urbanista publicou um artigo sobre o crescimento dos galpões em Cajamar no início de 2022 e se dedica a estudar o tema. “Talvez seja bom só pra quem é consumidor dessas empresas de ecommerce, que aí provavelmente o pacote vai chegar bem rápido no destino”, disse.
Yassu disse acreditar que o crescimento esvazia o “espírito da cidade”, que passa a ser vista só como um ativo financeiro e não como uma comunidade com cultura e dinâmicas próprias. “Afasta esse espírito. É como Barueri, também na zona metropolitana de São Paulo. A cidade cresceu por meio do mercado imobiliário, com empresas, galpões, fábricas e condomínios de luxo, como os do bairro de Alphaville”, afirmou. “Hoje quase ninguém fala que vai passar por Barueri, todo mundo diz que vai passar ou está indo para Alphaville. O espírito da cidade virou esse.”
Vista dos galpões do alto do morro de Santa Terezinha, em Cajamar (SP)
Foto: Rogério Lacanna/Nexo - 27.05.2022
Na visão de Aldo Garcia Junior, urbanista e mestre em urbanismo aplicado pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), Cajamar é uma cidade de contradições. “Por uma perspectiva, é uma cidade símbolo do progresso econômico e tecnológico do século 21. Por outro, traz consigo toda a precariedade de uma população profundamente vulnerável”, disse ao Nexo.
“Simbolicamente, é como se o paraíso dos galpões fosse alienado da própria população, já que eles estão ali apenas para gerar um progresso que vemos que não está sendo acessado por essa mesma população”, afirmou o urbanista. “Não vejo muita melhoria em tudo isso se essa lógica de achar que os galpões são a única forma da cidade crescer economicamente não mudar. Cajamar hoje é uma cidade em que o novo e o atraso vivem em conjunto.”